sexta-feira, 19 de abril de 2013

Manobra de Valsalva


Alguns dias atrás, em minha aula de canto com a turma semi-intensiva da 4act Performing Arts - http://www.4act.art.br/performingarts/2012/ - o professor Rafael Villar comentou sobre a manobra de Valsalva durante exercícios de musculação e seus impactos para as estruturas da laringe. Ontem tivemos uma aula incrível com dois renomados profissionais: Dr. Reinaldo Yasaki (Otorrino) e a Dra. Sílvia Pinho (Fonoaudióloga) ficou claro que um profissional da voz, como os cantores, deve ter em mente um trabalho multidisciplinar, com professor de canto, Fonoaudiólogo e Otorrino. Por isso vou dar algumas dicas sobre a manobra de Valsalva e como ela pode ser substituída no momento do exercício de força.
Antes é preciso relembrar a atuação de alguns músculos. Para inspirar utilizamos a contração do diafragma e dos músculos intercostais externos. O diafragma se encontra abaixo da cavidade torácica e sua contração infla os pulmões com ar atmosférico. Os intercostais externos, como o próprio nome diz, encontram-se entre as costelas e fazem um movimento de abdução costal (afastamento das costelas) aumentando a área torácica total.
Para expirarmos, utilizamos os músculos da parede abdominal anterior e os intercostais internos. A contração da parede abdominal faz com que o diafragma relaxado exerça pressão nos pulmões, exalando o ar inspirado anteriormente, e a contração dos intercostais internos (localizados entre as costelas) causa um efeito antagonista, ou seja contrário aos intercostais externos, comprimindo assim, ainda mais os pulmões.
A manobra de Valsalva é caracterizada pela contração do diafragma aliado ou não com os intercostais externos, enchendo os pulmões de ar, seguido por contração da parede abdominal. Como já vimos, a contração do abdômen exerce tensão no diafragma e pulmões e o esperado é que se expire o ar, porém, em algumas situações, como na musculação, o indivíduo contrai músculos da laringe formando um mecanismo valvular de retenção de ar (pregas vestibulares em adução), e isso geral um aumento da pressão intra-abdominal, intratorácica e intra-laríngea.
Alguns estudos¹ sugerem que esse aumento de pressão intra-abdominal aumente a estabilidade lombar durante um exercício de força intensiva, além disso se a manobra ocorrer de forma prolongada, atenua o fluxo sanguíneo venoso e acarreta uma diminuição acentuada do volume de ejeção sistólica do coração, desencadeando uma queda da pressão arterial até abaixo do nível de repouso. Quando a glote é aberta (abdução das pregas vestibulares) a pressão intra-laríngea e torácica são restabelecidas, porém com uma elevação excessiva na pressão arterial. Podemos ver o comportamento da pressão sanguínea durante a manobra de Valsalva no gráfico ao lado. (HÉBERT JL, et al. Pulse pressure response to the straim of the Valsalva maneuver in humans with preserved systolic function. J Appl Physiol 1998;85:817).
Apesar desse aumento fisiológico de pressão, a manobra só é contraindicada para hipertensos, cardiopatas e idosos. Mas o que ela acarreta para os tecidos da laringe? Alguns artigos² dizem que o aumento da pressão intra-laríngea tem grande responsabilidade no desenvolvimento de uma série de patologias. Assim como a tosse, que é uma manobra de Valsalva modificada (de curta duração) este mecanismo valvular de retenção do ar acarreta aumento do atrito entre as pregas vocais e uma irrigação excessiva dos tecidos.
Vale lembrar que estamos falando sobre profissionais da voz, ou seja, pessoas que utilizam a voz com mais intensidade. Por isso a economia do atrito entre as pregas vocais é um fator profissional e preventivo. O corpo humano como um todo possui uma capacidade morfo-funcional, ou seja de adaptar-se anatomicamente segundo a função da estrutura. Uma laringe utilizada de modo intenso e sem acompanhamento Fonoaudiólogo e Otorrino pode sofrer adaptações negativas, como calos e fendas.
Então, como realizar os exercícios de força evitando a manobra de Valsalva? Simples, não retenha o ar com a glote, mantendo os músculos da inspiração contraídos em isometria (diafragma e intercostais externos) sem causar um efeito valvular. Ou então, simplesmente inspire ao realizar o movimento concêntrico, sem tentar reter o ar.







Referências:
1- MCARDLE WD, KATCH FI, KATCH VL. Fisiologia do Exercício - Energia, Nutrição e Desemponho Humano. Editora Guanabara Koogan, Rio de Janeiro. Sexta Edição, 2001; p273-274.
2- THOMÈ R, THOMÈ DC. Laringocele e cisto sacular primário, tratamento cirúrgico por via externa: ressecção através da membrana tíreo-hióidea. Revista Brasileira de Otorrinolaringologia. Vol. 61 - edição 6, p.427-436.

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